domingo, 11 de janeiro de 2015

Post-Mortem: Morte por acidente

Como regra geral, quando uma pessoa morre, a longa conta do karma se fecha naturalmente — isto é, a complicada série de afinidades, que se estabeleceu durante a vida, no primeiro princípio durável, o quinto, já não é suscetível de aumentar. O saldo das contas, por assim dizer, não é exigido a não ser no próximo nascimento objetivo, ou, em outras palavras, as afinidades que no Devachan permanecem em estado latente, devido à ausência de sua esfera de ação própria, voltam a valer tão logo entrem de novo em contato com a existência física. Mas o quinto princípio, no qual essas afinidades se desenvolvem, não se desvincula, no caso da pessoa que morre prematuramente, do princípio terreno, isto é, do quarto princípio. Portanto, o elementais que assim se encontra no Kâma-loka, em sua violenta expulsão do corpo, não é um mero cascão, mas a própria pessoa, que vivia, sem que lhe falte mais nada que o corpo. No verdadeiro sentido da palavra, não está absolutamente morto.

Certos elementais dessa espécie podem comunicar-se de modo efetivo, nas sessões espíritas, às suas próprias custas. Pois, infelizmente, devido à inteireza de sua constituição astral, eles podem continuar gerando karma, ao mitigar sua sede pela vida na insalubre fonte da mediunidade. Se em vida eles pertenceram a um tipo muito material e sensual, os prazeres que buscarão serão de tal gênero, mesmo a ponto de conceber-se que seu deleite, no estado desencarnado, será mais danoso para seu karma do que o que foram os seus prazeres durante a vida. Nesses casos, facilis est descensos. Extirpados à vida terrena, em plena exacerbação de paixões que os ligam a cenas familiares, são seduzidos pela oportunidade oferecida pelos médiuns, para satisfazê-las por procuração. Convertem-se nos íncubos e súcubos de que falam os escritos medievais, demônios sedentos e glutões, levando as suas vítimas ao crime. Um breve ensaio sobre este assunto, escrito por mim, apareceu na Theosophist seguido de uma nota, em cuja autenticidade tenho minhas razões para confiar. Dele reproduzo aqui alguns parágrafos, cujo teor é o seguinte:

"A variedade de estados depois da morte é muito maior, se possível, do que a diversidade de vidas humanas nesta Terra. As vítimas de acidentes não se convertem, no geral, em andarilhos terrestres, mas somente os que caem na corrente de atração, os que morrem cheios de alguma grosseira paixão terrena, os egoístas, que nunca pensaram no bem-estar dos outros. Surpreendidos pela morte na realização, verdadeira ou imaginária, de alguma subjugadora paixão de suas vidas que não lograram satisfazer, ou mesmo tendo-a realizado, ansiando por mais, essas personalidades não podem passar nunca mais além da atração terrena para esperar a hora da liberação em feliz ignorância e pleno esquecimento. Entre os suicidas, aplica-se o que antes expusemos sobre os que levam ao crime as suas vítimas, como também àqueles que se suicidaram em conseqüência de um crime, para escapar à penalidade da lei humana, ou devido ao seu próprio remorso. A lei natural não pode ser impunemente violada. A inexorável relação causal entre a ação e o resultado somente atua em sua plenitude, no mundo dos efeitos — o Kâma-loka — e cada caso encontra ali um castigo apropriado, de mil diferentes modos, cuja descrição superficial exigiria muitos volumes."

Aqueles que "esperam pela hora da liberação em feliz ignorância e em pleno esquecimento" naturalmente são aquelas vítimas de acidentes que, na Terra, provocaram relações puras e elevadas e que, depois da morte, estão além do alcance das tentações que as correntes mediúnicas representam, da mesma forma como eram inacessíveis durante a vida, aos impulsos naturais para o crime.

A. P. Sinnet, O Budismo Esotérico.

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